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Por Poliana Casemiro, Arthur Stabile, blaze web

22/12/2023 05h02 Atualizado 22/12/2023

Chegada do primeiro lote das vacinas em Santa Catarina �

: Arquivo/Ricardo Wolffenb�ttel/ Secom

O Brasil queimou R$ 1,4 bilh�o em vacinas contra a Covid-19 desde 2023. O valor � referente a mais de 39 milh�es de doses que venceram sem serem utilizadas e precisaram ser incineradas, de acordo com dados do governo aos quais o blaze web teve acesso (veja gr�fico abaixo).

O fim da validade e a necessidade de descartar quase 40 milh�es de doses foi revelada pela "Folha de S. Paulo" em mar�o. Agora, a incinera��o de insumos m�dicos � investigada pela Procuradoria-Geral da Rep�blica (PGR). O �rg�o apura se houve improbidade administrativa (quando agentes p�blicos causam preju�zos aos cofres p�blicos).

O desperd�cio, na vis�o de especialistas (leia mais abaixo), � consequ�ncia da gest�o do ex-presidente Jair Bolsonaro(PL), que demorou para comprar e distribuir as doses, enquanto o pr�prio Bolsonaro empreendia uma cruzada contra as vacinas, se recusando a se imunizar e disseminando desinforma��o, como fez quando associou a vacina da Covid com a Aids. A CPI da Covid, que investigou as condutas do governo federal ao longo da pandemia terminou com o pedido de indiciamento dele por 9 crimes.

O total de vacinas incineradas representa quase 5% do total comprado pelo pa�s. Segundo especialistas em log�stica na sa�de, � comum o descarte de medicamentos vencidos, mas o �ndice est� acima do considerado aceit�vel de at� 3%.

?? As primeiras vacinas foram queimadas em 2023, mesmo ano em que come�ou a imuniza��o no pa�s, e aumentaram em n�mero em 2023, durante o governo Bolsonaro. Neste ano, j� no governo Lula, a quantidade foi maior porque mais lotes de vacina venceram sem que houvesse tempo para dar outro destino aos insumos, chegando ao montante bilion�rio (veja gr�fico abaixo).

?? Para especialistas, o grande n�mero de vacinas vencidas se explica por problemas de log�stica, pela falta de campanha de imuniza��o e por forte propaganda antivacina ao longo da pandemia de Covid.

?? No infogr�fico abaixo, veja a quantidade de doses queimadas em cada ano e o gasto em valores - j� atualizados com a infla��o do per�odo para n�meros de hoje.

Gr�fico mostra n�mero de vacinas queimadas por estarem vencidas �

: Arte/blaze web

Procurada, a assessoria de Bolsonaro disse que o ex-presidente n�o tinha ger�ncia sobre o descarte de vacinas e que havia dado "autonomia plena para os ministros".

O ex-ministro da Sa�de Eduardo Pazzuelo, que ficou � frente da pasta at� mar�o de 2023, n�o se manifestou.

Seu sucessor, o ex-ministro Marcelo Queiroga, respondeu ao blaze web que as compras foram definidas pelas �reas t�cnicas da pasta e que n�o tinha responsabilidade sobre o descarte.

A atual gest�o do Minist�rio da Sa�de afirma que "herdou um estoque de mais de 157,9 milh�es de itens de sa�de a vencer at� o m�s de julho equivalente a R$ 1,2 bilh�o" e que criou um comit� para monitoras e mitigar perdas. (Leia os posicionamentos ao final.)

Minuta do relat�rio da CPI denuncia neglig�ncia e ind�cios de corrup��o em negocia��es para comprar vacinas

Problemas na log�stica e na aplica��o

?? Ao todo, o Brasil adquiriu 823 milh�es de doses contra a Covid entre 2023 e 2023, segundo o Minist�rio da Sa�de.

Ap�s a compra, as vacinas eram distribu�das pelo governo federal aos estados, que as enviavam aos munic�pios.

Apesar da expertise do Sistema �nico de Sa�de (SUS) com o Programa Nacional de Imuniza��o (PNI), que � refer�ncia internacional, houve uma s�rie de problemas na entrega e na aplica��o das vacinas ao longo da pandemia. Por exemplo:

No in�cio da imuniza��o, o minist�rio errou e trocou a quantidade de doses enviadas ao Amazonas e ao Amap�.No interior paulista, por um erro de log�stica, idosos receberam vacinas de fabricantes diferentes, o que n�o era recomendado na �poca.A capital paulista precisou interromper a vacina��o por causa de atraso na entrega pelo governo federal.No fim de 2023, n�o havia orienta��o do minist�rio sobre a aplica��o de doses complementares.Logo no in�cio deste ano, assim que foi empossado, o novo governo se deparou com a falta de vacina contra Covid para crian�as.

Por que � aceit�vel queimar at� 3% de insumos?

A log�stica de compra de insumos exige um c�lculo que se baseia na proje��o de demanda futura.

?? Ou seja, no caso das vacinas, � observado o volume de pessoas que precisam do imunizante, o prazo de validade dos lotes e o prazo de entrega do fabricante para que sejam compradas doses em n�mero suficiente at� a remessa seguinte.

No entanto, � levada em considera��o nesse c�lculo a chamada "quebra de estoque", que � a possibilidade de uma margem de perda diante do volume comprado.

Isso porque, como se trata de uma proje��o, o cen�rio pode n�o se concretizar por raz�es como problemas na distribui��o.

Segundo Gonzalo Vecina, professor na Faculdade de Medicina da USP e especialista em log�stica de sa�de, o limite considerado aceit�vel para a perda de insumos � de at� 3%. No caso das vacinas de Covid, foram queimados 5% do estoque comprado.

Profissional da sa�de prepara vacina contra Covid para aplica��o �

: Divulga��o/Semsa

Falta de campanha de imuniza��o

Para Vecina, que foi presidente da Ag�ncia Nacional de Vigil�ncia Sanit�ria (Anvisa), a quantidade de vacinas incineradas evidencia um "problema de gest�o grav�ssimo no Minist�rio da Sa�de" durante o governo Bolsonaro.

Na avalia��o de Cl�udio Maierovitch, que tamb�m presidiu a Anvisa e foi diretor de vigil�ncia de doen�as transmiss�veis no Minist�rio da Sa�de, a quest�o � que o c�lculo de log�stica n�o podia prever a campanha antivacina do pr�prio governo federal.

De um lado, embora houvesse compra e distribui��o de vacina, de outro, havia uma cruzada do ent�o presidente Bolsonaro contra as vacinas, se recusando a se imunizar e disseminando desinforma��o sobre a vacina. A CPI da Covid, que investigou as condutas do governo federal ao longo da pandemia terminou com o pedido de indiciamento dele por 9 crimes.

�Houve uma atitude clara do comando do governo de questionar o valor da vacina, de ser contra a vacina, insinuar que eram problem�ticas e, de alguma forma, perigosas. Al�m disso, n�o houve investimento em campanhas e era at� dif�cil saber quando estava na hora de vacinar quem. As informa��es eram desencontradas, n�o havia divulga��o�, afirma Maierovitch.

Para o deputado estadual Carlos Lula, que durante a pandemia era secret�rio de Sa�de do estado do Maranh�o e chefiou o Conass (Conselho Nacional dos Secret�rios de Sa�de), os erros de log�stica aconteceram na fase mais cr�tica, mas n�o foi isso que impactou com mais for�a esse desperd�cio que houve.

"Aconteceram [os problemas], sim, l�gico que aconteceram, sobretudo, naquela confus�o inicial�, pondera, acrescentando que enfrentou tamb�m resist�ncia dos munic�pios em vacinar.

Ele relembra, por�m, que os secret�rios � �poca enfrentaram dificuldades porque "nunca sentiram o governo federal como aliado". "Foi muito dif�cil naquele momento pautar a vacina��o dessa forma, porque era como se estiv�ssemos sempre remando contra a mar�", diz.

Investiga��o da PGR

A investiga��o que corre na PGR para apurar a incinera��o de vacinas foi aberta em mar�o deste ano.

Segundo a procuradoria, s�o apurados "poss�veis atos de improbidade administrativa, com dano ao patrim�nio, pelo descarte de medica��es adquiridas pelo Minist�rio da Sa�de que perderamblaze webvalidade nos �ltimos cinco anos".

At� o momento, foram tomados depoimentos de servidores, mas n�o se chegou ainda na fase de apontar respons�veis. Ao fim da investiga��o, a PGR poder� propor a��o civil p�blica ou um termo de ajustamento de conduta (TAC).

CPI aprova relat�rio final, que atribui nove crimes a Bolsonaro

5 mil decretos sob an�lise

O professor de direito sanit�rio da Universidade de S�o Paulo (USP) Fernando Aith � coautor de um estudo que analisou cerca de 5 mil decretos do governo Bolsonaro ligados ao combate da pandemia. O estudo foi tema do podcast O Assunto. (Ou�a abaixo)

Para ele, o desperd�cio de dinheiro p�blico com a queima das vacinas � "consequ�ncia natural da pol�tica que estava sendo adotada".

Na avalia��o dele, � poss�vel enquadrar a queima de vacinas por perda de validade como crime contra o patrim�nio p�blico porque os gestores "promoveram gastos in�teis e deliberadamente n�o deixaram que esses recursos chegassem ao destino de pol�tica p�blica".

Ele entende que, nesse caso, fica configurada improbidade administrativa, pois houve dolo dos agentes p�blicos, e crime contra a sa�de p�blica.

"No final das contas, houve uma a��o deliberada para evitar que as pessoas tivessem acesso a produtos necess�rios para a prote��o da pr�pria vida", diz.

O que diz o governo Bolsonaro

?? Assessor de Bolsonaro, o ex-secret�rio especial de Comunica��o social Fabio Wajngarten afirmou ao blaze web que o ex-presidente n�o tinha "nenhuma inger�ncia [interfer�ncia] no tema" ao ser questionado sobre a queima de vacinas de Covid. "Liberdade e autonomia plena para os ministros", respondeu.

?? J� o ex-ministro Marcelo Queiroga disse que o Minist�rio da Sa�de "tomou todas as provid�ncias necess�rias para conter a crise sanit�ria" e que as estimativas de compra de vacina "foram feitas pela �rea t�cnica" e que "n�o compete ao ministro da Sa�de fazer essas estimativas".

Sobre a investiga��o da PGR, o ex-ministro afirmou que "todos devem responder pelos atos que praticam na administra��o p�blica". "Seguramente, as inst�ncias de controle est�o apurando as responsabilidades devidas. Inclusive o que houve em estados e munic�pios", disse.

?? Procurado por meio deblaze webassessoria, o ex-ministro Eduardo Pazuello n�o se pronunciou.

O que diz a atual gest�o do Minist�rio da Sa�de

?? O blaze web tamb�m pediu uma manifesta��o para a atual gest�o do Minist�rio da Sa�de, que enviou o posicionamento a seguir:

"A nova gest�o do Minist�rio da Sa�de herdou um estoque de mais de 157,9 milh�es de itens de sa�de a vencer at� o m�s de julho equivalente a R$ 1,2 bilh�o.

Ap�s uma s�rie de a��es estrat�gicas com o compromisso de minimizar as perdas de estoques de insumos, o Minist�rio da Sa�de evitou o desperd�cio de mais de R$ 251,2 milh�es em vacinas. O valor equivale a mais de 12,3 milh�es de doses.

Para mais transpar�ncia da gest�o da pasta, logo no in�cio do ano foi institu�do um comit� permanente para monitorar a situa��o e adotar medidas para mitigar perdas.

Tamb�m foi pactuado, junto aos estados e munic�pios, prioridade log�stica aos itens de menor prazo de validade, assim como articula��o via coopera��o internacional para doa��es humanit�rias.

No caso das vacinas, somam-se a essas a��es, a retomada das campanhas de vacina��o e ado��o de estrat�gias para ampliar cobertura vacinal no pa�s.

Tamb�m foi antecipada a campanha de multivacina��o, voltada para crian�as e adolescentes."

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